terça-feira, 15 de março de 2016

Colecção primavera verão

Às vezes, não sei bem porquê, tudo isto me mete nojo, o que é tudo isto?, sei lá, em primeiro lugar sou eu, tenho uma posição privilegiada para me ver, pelo menos era o que pensava, na verdade não vejo um caralho à minha frente de mim (deixem passar), e relativamente às outras frentes vejo, distingo, rumino, martirizo-me com merdas que não interessam a ninguém,  não aprendo nada, não aprendi nada, penso, mas até esse pensar é pesado, balofo, entregue a uma voragem que culmina sempre no caralho do eu, eu, eu, mim, mim, eu, ou isso, é como se transportasse o meu cadáver às costas (como num poema, não me lembro qual), ou se calhar transportasse a ideia de um cadáver que transportava às costas, não podemos esquecer que o cool arrumou as suas roupinhas à nossa porta, o cool, a natureza, a macrobiótica, os micróbios fixes, as calças rotas (com rotinhos desenhados geometricamente) compradas na loja, merdas que nos recordam a existência de parágrafos. Quero dizer, estou aqui, ando por aí, cago, mijo, vou comendo umas cenas, bebo muita cerveja (o que em princípio me aproximaria de muitas unidades anatómicas), desloco-me de forma autónoma e locomotora, isto é, sou uma espécie de material rodante privilegiado, não vou ao cinema ver aqueles filmes do costume que depois passam duzentas vezes no Canal Hollywood, fumo cigarros de enrolar uns atrás dos outros mas só lá mais para a noute, faço merdas incrivelmente banais, passíveis de me anular completamente, mesmo anuladinho de todo, ali a canto, e ainda assim parece que cresce uma vontade (já não sei o que escrevi atrás) neste aparelho inóspito, uma contradição a dar para o paradoxo (deixem passar), uma cena que não se consegue envolver em massa pão, nem sequer esconder atrás da bicicleta do puto do vizinho, não se consegue. Queria criar uma  colecção primavera verão de mim próprio. Uma colecção que arrumasse com isto. 

4 comentários:

  1. obrigado por estes textos.
    de certeza que vou adorar a nova coleção:)

    jinhs

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    1. de nada:)

      estamos em pleno processo criativo:) a passarela está aí à porta:))))

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  2. Vi um filme "vejo tudo nu" de Dino Risi. Descrevem como comédia. Não me lembro de rir. Gostei das cartas entre a Ornella e o Carlos Alberto. Só que ela só era Ornella à porta fechada e ele era sempre o Carlos Alberto. À distância o mistério é sempre mais misterioso ( deixa passar) :)
    H.

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    1. :)
      tenho algures esse filme ali para um monte atrás da ribanceira da estante:) ou à frente já não sei:) recordo partes e não e lembro de rir por aí além:) estaria mais concentrado em certas imagens?:))) De facto, à distância é tudo muito mais misterioso...

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