terça-feira, 31 de março de 2020

Cãorentena (zoo (m)

Os pássaros rejubilam (gosto desta palavra). Se tivéssemos cisnes no burgo, certamente andariam por aí, aproveitando o ar puro e a liberdade de movimentos, pavoneando-se, os cisnes rejubilariam, pedindo meças à gaivota de estimação aqui do bairro, desaparecida misteriosamente, ou também ela, coitada, em isolamento social. Faltam os gatos. Contam-se menos mãos que os alimentam, contam-se menos gatos, e os cães (não emancipados) já não passeiam os donos, passaram a ser o prolongamento das suas desculpas. Os problemas de bexiga caninos já necessitam de um comprovativo para circulação. De resto, imagina-se: as ratazanas andam à coca, os morcegos, dois ou três, continuam a sair reportando medo de represálias, as galinhas prosseguem a construção de um túnel para fora das nossas panelas. (As galinhas não são infectadas). Os patos fazem exercício... às vezes com cães pela trela. Outros vão trabalhar porque não conseguem voar. O céu passou de azul para cinza escuro, batido pelo vento o frio declarou-se inocente. Depois ficou escuro outra vez. Talvez tenha chovido. Não sei.

segunda-feira, 30 de março de 2020

Cãorentena (que dia é hoje?)


Zzzz… onde fica o lá fora? Não fui correr, nem dentro da casota. Demorei a adormecer (isto ontem que já era hoje). A insónia era em forma de livro. Escrevi de um golpe o guião da primeira página e deixei no ar várias ligações que determinariam a sua sequência, tudo mentalmente, no escuro, a páginas tantas, não acontecia nada, não saia daquela página, embora o guião ganhasse contornos de incunábulo mental, cada vez mais pesado, vogando por geografias indemonstráveis a olho nu, e eu no escuro, com o pijama do super-homem (os cães gostam dessas merdas) electrificado pelo calor da cama. De fora devia ser bonito, mas para se ver seria necessário ter à mão aqueles óculos com infravermelhos como se vê nos filmes americanos. Fui mijar. Foi preciso acender a luz. Acender? Assim a olho tinha a cabeça cheia e ao mesmo tempo vazia. Este paradoxo acompanhou-me de volta à cama. Estava escuro outra vez. Zzzzz…

quinta-feira, 26 de março de 2020

Cãorentena (layoff simplificado)


Escreveu um dia Nietzsche que: a loucura é rara nos indivíduos, mas é regra nos grupos, partidos, povos e épocas. É claro que Nietzsche enlouqueceu. A excepção confirma regra.

quarta-feira, 25 de março de 2020

Cãorentena (tem dias)


Onde que eu ia? Ah, já sei, beber um chá e ver um filme. Ou uma série? Ou ler um livro? Não me distraiam, por favor...tenho afazeres.

domingo, 22 de março de 2020

Cãorentena (matéria prima para um livro)

Olhei outra vez lá para fora. O mundo continuava desaparecido. Fui tomar duche.

comparem (se quiserem):

A Alemanha declarou guerra à Rússia. À tarde fui nadar. [ou à piscina, depende] - Kafka

sábado, 21 de março de 2020

Cãorentena (não confundir com "quatarantina")


Um dia, acho que foi ontem, Gabriel Pedro escreveu: o consumo é o produto final da razão que o sustenta. Não interessa o que está a montante, nem sequer a jusante, truncado fica mesmo bem. Andei anos a reflectir e o máximo que cheguei foi: o tempo passa, o Cão sonha, tem dias que a obra nem nasce nem sai de cima. Lindo, não é?