domingo, 27 de julho de 2014

dia não si quantozzzzzzzzzzzz: mas afinal que dia é hoje?

Conheci (ou imaginei, tanto faz) um tipo que também era cão, um tipo-cão, um tipo (deixem passar) que fazia um dossier da vida, encapava-a, jornais, revistas, pensamentos, livros, gastos, merdas que queria fazer e não fazia, merdas que fazia e não queria fazer, comida que gostava de malhar, tipas-cão, dias de sol à paisana, ventos que lhe recordavam os seus cabelos, viagens adiadas, viagens vividas e desperdiçadas em conversetas, viagens recortadas em suplementos de jornais, filmes, músicas, rosnadelas, frutos diversos, os vários tipos de medo. Queria conferir a morte, o envelhecimento, queria ter a certeza que o esquecimento não o precedia, queria estar preparado para dizer não, escutar o não, queria fundamentalmente não tomar isto a sério, um somatório de contradições, dizia – é só confirmar. O dossier crescia a olhos vistos até se confundir com a própria vida (aqui recorremos a Borges atravessando o rio num tronco finíssimo), devidamente encadernada e colocada em estantes, em prateleiras, em bibliotecas, em salas de estar, em nichos suspensos nas árvores e até em grutas cujo nível de humidade era devidamente controlado. Aos poucos, o dossier em curso dir-se-ia em tudo semelhante à vida, e o próprio vocábulo dossier era utilizado para dizer vida. Recordo o tipo-cão, não estarei enganado se afirmar que era um belo dia de Julho, uma terça-feira de manhã, em tudo igual aos outros dias, o tipo-cão tinha acabado de ler e catalogar, à socapa, um texto merdoso cujas lincadelas pareciam afluentes do Nilo, olhou em redor para ver se não estava a ser observado, a filmantes carburava, mas ele parecia estar mesmo a trabalhar, lá se levantou vagueando o seu tédio pensativo pelo escritório, aguardava uma má notícia a qualquer hora, e qualquer hora deixa de servir como uma boa hora para uma má notícia que não chega, ou isso, o seu cérebro pós-texto e pós-últimas-merdas-dos-últimos-tempos, assemelhava-se a uma daquelas instalações pós-modernas que nos enrabam o olhar em alguns museus, mas neste caso não fazendo qualquer sentido até para o próprio, obrigando-o a tomar resoluções baseadas em folhas dispersas, rasgadas ao acaso, ou impressas em pequeníssimos núcleos semelhantes a ilhas, uma caligrafia pequenina à Walser ia-se infiltrando até ao último dos ácaros, talvez procurando desaparecer. Nesse momento algo terá mudado. Mas não se sabe bem o quê. 

6 comentários:

  1. esta cena dava um conto:)ou isso:))

    DdC vai de férias

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    1. é mais isso:) ou os contos:) carcanhol mesmo:)

      para férias vai precisar de contos:) ou euros:)))

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  2. tendo em consideração (ou em linha de conta:) a largura do tronco, a coisa vai:))

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