quarta-feira, 30 de julho de 2014

dia não sei quantos e tal quarta: a pasta está vazia

Consta que me levantei. Que fui duchar. Que depois bebi um chá preto com bolo de noz. Diz que a seguir apanhei o elevador, que também se apanham elevadores como doenças más, diz que me doía a cabeça, que e náusea fazia ninho e que os restos da noite não saiam com nenhuma sacudidela. Para entrar no carro diz que abri a porta, mas nunca se sabe. Do rés-do-chão, ali ao pé, já ressumava um cheiro a estrugido para ajudar à festa, conforme está comprovado. Em todo este trajecto diz que não tomei nada. Entretanto, consta que me deu para pensar em merdas:

a cena de ontem
a cena de anteontem
há quanto tempo não vou correr?
E livros novos e leituras, que seja?
E discos?
Que passeatas?
A cena do catálogo de rotinas que desagua nas ditas...
em que rua fica, este ano, o mar?
Que bebidas espirituosas não são alcoólicas e vice-versa??
será que se pode comer pizza de faca e garfo à mesa da cozinha, sem televisão?
será que se pode comer pizza com salada de tomate (daqueles tomates verdadeiros) de faca e garfo, sentado no sofá a ver a guerra dos tronos?
Merdas assim...



domingo, 27 de julho de 2014

dia não si quantozzzzzzzzzzzz: mas afinal que dia é hoje?

Conheci (ou imaginei, tanto faz) um tipo que também era cão, um tipo-cão, um tipo (deixem passar) que fazia um dossier da vida, encapava-a, jornais, revistas, pensamentos, livros, gastos, merdas que queria fazer e não fazia, merdas que fazia e não queria fazer, comida que gostava de malhar, tipas-cão, dias de sol à paisana, ventos que lhe recordavam os seus cabelos, viagens adiadas, viagens vividas e desperdiçadas em conversetas, viagens recortadas em suplementos de jornais, filmes, músicas, rosnadelas, frutos diversos, os vários tipos de medo. Queria conferir a morte, o envelhecimento, queria ter a certeza que o esquecimento não o precedia, queria estar preparado para dizer não, escutar o não, queria fundamentalmente não tomar isto a sério, um somatório de contradições, dizia – é só confirmar. O dossier crescia a olhos vistos até se confundir com a própria vida (aqui recorremos a Borges atravessando o rio num tronco finíssimo), devidamente encadernada e colocada em estantes, em prateleiras, em bibliotecas, em salas de estar, em nichos suspensos nas árvores e até em grutas cujo nível de humidade era devidamente controlado. Aos poucos, o dossier em curso dir-se-ia em tudo semelhante à vida, e o próprio vocábulo dossier era utilizado para dizer vida. Recordo o tipo-cão, não estarei enganado se afirmar que era um belo dia de Julho, uma terça-feira de manhã, em tudo igual aos outros dias, o tipo-cão tinha acabado de ler e catalogar, à socapa, um texto merdoso cujas lincadelas pareciam afluentes do Nilo, olhou em redor para ver se não estava a ser observado, a filmantes carburava, mas ele parecia estar mesmo a trabalhar, lá se levantou vagueando o seu tédio pensativo pelo escritório, aguardava uma má notícia a qualquer hora, e qualquer hora deixa de servir como uma boa hora para uma má notícia que não chega, ou isso, o seu cérebro pós-texto e pós-últimas-merdas-dos-últimos-tempos, assemelhava-se a uma daquelas instalações pós-modernas que nos enrabam o olhar em alguns museus, mas neste caso não fazendo qualquer sentido até para o próprio, obrigando-o a tomar resoluções baseadas em folhas dispersas, rasgadas ao acaso, ou impressas em pequeníssimos núcleos semelhantes a ilhas, uma caligrafia pequenina à Walser ia-se infiltrando até ao último dos ácaros, talvez procurando desaparecer. Nesse momento algo terá mudado. Mas não se sabe bem o quê. 

domingo, 13 de julho de 2014

dia não sei quantos ognimod siod: questiúnculas

Estava a ultimar a minha entrevista ao Vilamatinhas e a minha entrevista imaginária ao Ludwig, estava por assim dizer a amassar o pão para alimentar o cérebro, nisto (não se iludam com o tempo verbal, antes retenham a expressão vernacular), a biblioteca estantina fez-me chegar em mão uma cena do Allègre (o Claude, não confundir pf com o Nel) quando este afirma que “vamos começar por expor a hipótese da nebulosa protossolar quente”, hipótese falsa, para não dizer mais, segundo Claude, com consequências invisíveis na vida das pessoas, mesmo das pessoas reais, a gente não seja cão se não nos dá para pensar na auscultação pulmonar do planeta terra, culminado em duas questões:

-Porquê a utilização de parágrafos tão Longos e desconexos?
-Mesmo observando um passado cada vez mais recuado, conseguiremos não perder tempo, ou mesmo perder tempo, com conhecimentos que embatem no reposteiro de roupagem religiosa?

Assim irei desaguar ao “Assim na terra como no céu – ciência, religião e estruturação do pensamento ocidental”, da Clara Pinto Correia e do José Pedro Sousa Dias.
Entretanto fodi o joelho na máquina de lavar roupa.

domingo, 6 de julho de 2014

dia não sei quantos ognimod: zzzdryzzme

Depois de morfar a sopa e o resto do frango de sexta, acompanhados por aquela bebida que não é para novos, a cena do Iggy, a Lemon Dry da Schweppes,ou isso, depois disso, mas onde é que eu ia?, bebi um café e dei comigo a ler isto: cunha uma moeda de cada erro, uma cena do Ludwig escrita em 1948. Fiquei uns bons quatro minutos pendurado na ribanceira do pensamento e depois continuei a limpeza da casota. 



quinta-feira, 3 de julho de 2014

dia não sei quantos who cares quinta: toute a ver tou

Continua a lenta que se diz marcha, para o torto, para o lado, alarga, embrutece, joga à bola com os pensamentos em pelota, ou isso. Faz-se tarde sem sair do caralho do sítio, passaram quê, dez minutos?, nada disto tem letra grande dentro, ainda se vai googlar sobre J. Rodolfo Wilcock ou John Webster Spargo, à má fila, mas nem isso renova as células cerebrais acompanhando a celeridade com que estas se suicidam. Melhor beber copos, pensas, ao menos é um homicídio premeditado, não um caralho de um Mário de Sá Carneiro celular com estricnina. Desculpa lá Mário. Entretanto, vai-se um cartão, assobia-se à banda magnética, não aparece, um funcionário cansado saído de uma rua lateral ao poema do Ramos Rosa, debita uns que e tal, vais para a bicha, tens um papelinho nas mãos, parece que te estou a ver. Parece mesmo que te estou a ver (risinhos).  

terça-feira, 1 de julho de 2014

dia não sei quantos terça: sem adapta(dor)

Como vão os dias? Em contramovimento. As regiões adiposas convergem misteriosamente (trata-se de um movimento com a lentidão visual das placas tectónicas) para zonas de confronto, também divergem para zonas de confronto, áreas cuja importância é indiscutível no terreno do corpo. No sonho, movia-me a uma velocidade maior do que a vida, agarrava-me ao corpo como se de um eléctrico se tratasse e, nas extremidades do túnel visual, paredes?, ramagens?, apetitosas maçãs condescendiam que as apanhasse sem problemas de maior. Toca o despertantes, onde está o copo de água?, fazer um chá, correr para o duche (até este ponto tudo se resume a um reflexo condicionado), mandar tudo para o caralho (ainda reflexo condicionado), está quente, frio, vestir, calçar, marcha o chá preto, marcha a torrada, afinal foi um bolo, e já estás a confirmar as pulsações, a medir mentalmente a tenção, a apanhar o elevador, a vomitar um troço da tua vida, a desbaratar o olhar pelo espaço pejado de carros, pessoas, mais carros que pessoas, pensas: como é possível?, e o corpo em riste vai na frente da marcha lenta.